No Antigo Testamento, o sagrado pacto entre o povo de Israel e o SENHOR Deus (יהוה, Yahweh) é selado através de um ritual profundo: a remoção do prepúcio do órgão reprodutivo masculino. No Judaísmo, este rito é conhecido como בְּרִית מִילָה (Brit Milah, ou “pacto do corte/pacto cortado”). Nos tempos antigos, as pessoas formalizavam laços e tratados através de rituais que frequentemente envolviam o corte de animais ou partes do corpo. O termo moderno em inglês “circuncisão” frequentemente falha em transmitir o profundo significado bíblico deste ato.
Muitos assumem que este ato distinguia Israel de outras nações, mas há algumas questões que complicam isso: A marca, escondida sob as roupas, era apenas para homens, e nem sequer era única—as elites egípcias, por exemplo, tinham sua própria versão da circuncisão muito antes de Israel. Consequentemente, o que tornava a prática de Israel especial? Por que Deus escolheu este sinal em particular? Por que Deus escolheu apenas homens? E, mais intrigante, por que o oitavo dia?
Um Pacto para as Gerações
A circuncisão israelita era distinta de sua contraparte egípcia de várias maneiras importantes. Para Israel, era um sinal do pacto entre Abraão, seu Deus e seus filhos. Quando Deus falou a Abraão sobre a natureza e o tipo de promessas, Ele especificou que:
“E estabelecerei o meu pacto entre mim e ti e a tua semente depois de ti, nas suas gerações, por pacto perpétuo, para te ser a ti por Deus, e à tua semente depois de ti.” (Gênesis 17:7 ACR)
A fé de Abraão veio primeiro—ele confiou em Deus e foi declarado justo (Gênesis 15:6). Então Deus deu a ele o sinal da circuncisão (Gênesis 17:10-14). Mas para seus descendentes, a ordem se inverteu. Eles recebiam a marca do pacto quando bebês, muito antes de poderem escolher a fé ou a obediência. Só então os pais os criavam no SENHOR. Em outras palavras, o sinal do pacto abraâmico vinha primeiro para os bebês israelitas, vinculando-os a Deus e Deus a eles. Não há pacto sem filhos. O futuro de Israel, o povo escolhido de Deus, dependia da próxima geração. A circuncisão não era apenas um ritual; era um legado, um voto selado em sangue de que Deus seria seu Deus para sempre.
Por Que Apenas Homens?
Os povos antigos não compreendiam plenamente a concepção, mas sabiam que as mulheres geravam crianças. Ainda assim, suas crenças frequentemente se concentravam no papel masculino na procriação, com a “semente” simbolizando linhagem e legado. O órgão masculino, como fonte dessa semente, tornou-se o ponto focal para um ritual que significava pacto—a promessa de Deus de multiplicar os descendentes de Abraão como as estrelas do céu. Outras partes do corpo, como o coração e os ouvidos, também eram circuncidadas, mas de maneira metafórica (Deuteronômio 10:16; 30:6; Jeremias 4:4, Romanos 2:24-29). Lemos:
“Circuncidai-vos ao Senhor e tirai os prepúcios de vosso coração, ó homens de Judá e habitantes de Jerusalém, para que não saia como fogo a minha indignação, e se acenda, e não haja quem a apague, por causa da maldade dos vossos feitos.” (Jeremias 4:4 ACR)
No antigo Israel, os homens eram os chefes da família, divinamente designados para liderar, prover e proteger. As mulheres tinham funções vitais—gerar e criar filhos, nutrir a família—mas os homens carregavam o fardo da liderança. Embora alguns estudiosos modernos vejam o processo como excluindo mulheres, o ritual provavelmente refletia a estrutura patriarcal do antigo Israel, onde os homens carregavam a responsabilidade legal pela obediência covenantal. A circuncisão, como um sinal do pacto, marcava aquele incumbido de guiar a casa nos caminhos de Deus.
O Oitavo Dia nas Escrituras
A ordem de Deus era precisa: a circuncisão deveria acontecer no oitavo dia.
“E da idade de oito dias, todo o varão entre vós será circuncidado, por todas as vossas gerações; o nascido na casa, e o comprado por dinheiro a qualquer estrangeiro, que não for da tua semente.” (Gênesis 17:12 ACR)
Primeiro, esta circuncisão não era apenas para a linhagem de sangue de Abraão. Qualquer um trazido para a família—escravo ou estrangeiro—recebia a marca e era enxertado no pacto de Deus.
Segundo, o oitavo dia, conhecido como yom hashmini (יוֹם הַשְּׁמִינִי) no Antigo Testamento, simboliza consistentemente novos começos, transformação e consagração. Este padrão sagrado aparece em vários rituais importantes. Por exemplo, a consagração sacerdotal conclui no oitavo dia (Levítico 8:33–9:1), marcando o início de seu serviço santificado. Da mesma forma, aqueles curados de doenças de pele passam por ritos de purificação no oitavo dia (Levítico 14:10), marcando a reinclusão na vida comunitária. Outro exemplo proeminente é o Shemini Atzeret (שְׁמִינִי עֲצֶרֶת), o “oitavo dia de assembleia” que segue os sete dias de Sucot (Levítico 23:36; Números 29:35). Este dia santo distinto, caracterizado por uma convocação sagrada e ofertas especiais, sublinha a completude e renovação divinas. O oitavo dia é a assinatura de Deus em tempos de renovação espiritual, e adiciona um ritmo de mudança ao Seu relacionamento de pacto com as pessoas.
Embora alguns sugiram que o oitavo dia foi escolhido por Deus por razões práticas, como a saúde do bebê, uma vez que os níveis de vitamina K, cruciais para a coagulação sanguínea, se estabilizam por volta do oitavo dia, esta perspectiva apenas aprofunda a maravilha do desígnio de Deus. O alinhamento da prontidão física com o significado espiritual reflete Sua intencional união do natural e do sobrenatural, onde até os ritmos do corpo ecoam o padrão divino de renovação.
Jesus e a Circuncisão
Jesus, nascido numa família judaica, foi circuncidado no oitavo dia (Lucas 2:21), cumprindo a ordem covenantal dada a Abraão (Gênesis 17:12). Este ato de seus pais O ancorou dentro do pacto de Israel com Deus, afirmando Sua identidade como parte do povo escolhido de Deus e Seu papel na promessa abraâmica (Gênesis 17:7).
Como visto antes, o oitavo dia carrega um profundo significado nas Escrituras, simbolizando novos começos, transformação e consagração. Este padrão encontra sua expressão máxima na ressurreição de Jesus no “oitavo dia” (o primeiro dia após o Sábado), significando o novo começo, transformação e consagração definitivos (Agostinho, Sermão 260C).
A visão minoritária sugere que Jesus não ressuscitou no domingo porque as mulheres encontraram o túmulo vazio no início da manhã daquele dia, implicando que Ele ressuscitou mais cedo. Esta é uma inferência razoável, pois o túmulo vazio indica uma ressurreição anterior. Alguns propõem que Deus ressuscitou Jesus no Shabat para preservar sua santidade. Embora possível, esta suposição é desnecessária para sustentar a santidade do Shabat. Creio que Jesus ressuscitou entre a tarde de sábado e o início da manhã de domingo. Na tradição judaica, a tarde de sábado marca o fim do Shabat e o início do primeiro dia da semana, domingo, pois os dias começam ao pôr do sol. Em hebraico, apenas o Shabat é nomeado, enquanto outros dias são numerados, carecendo de status sagrado (sagrado vs. comum). Assim, uma ressurreição após o pôr do sol se alinha com nosso domingo, o primeiro dia, sem comprometer a santidade ou alto status do Shabat. Este momento se encaixa tanto na narrativa bíblica quanto no cálculo judaico, mantendo a consistência teológica sem exigir uma ressurreição no Shabat.
Como cabeça da Nova Aliança, Jesus, o “último Adão” (1 Coríntios 15:45), estende a promessa de Deus de salvação, provisão e proteção a toda a humanidade—seja judeu ou grego, homem ou mulher, escravo ou livre (Gálatas 3:28-29). Sua ressurreição no oitavo dia confirma a eficácia de Seu sacrifício na cruz, pois Seu corpo inteiro, marcado por inúmeros sinais de violência humana, serve como testemunho da aprovação de Deus e como garantia de que Ele fez novas todas as coisas (Apocalipse 21:15).
O significado do oitavo dia não para aí. A ressurreição de Jesus, no “oitavo dia” (o primeiro dia após o Sábado), é o novo começo definitivo. É o dia sagrado em que toda a criação renasceu (2 Coríntios 5:17), o pacto cumprido de um modo que Abraão só poderia sonhar. Como o “último Adão” (1 Coríntios 15:45), Jesus tornou-Se a cabeça de uma Nova Aliança, abrindo as portas da salvação para todos—judeu ou grego, homem ou mulher, escravo ou livre (Gálatas 3:28-29). Seu corpo profundamente marcado, que ressuscitou naquele oitavo dia, ainda carregava os sinais da brutalidade humana que haviam sido transformados em um pacto na cruz romana.
Conclusão
A circuncisão no oitavo dia serve como um poderoso emblema da promessa divina, transformação e renovação, entrelaçadas no tecido do pacto de Deus com a humanidade. Desde a fé obediente de Abraão até a ressurreição de Jesus, o oitavo dia entrelaça uma narrativa de esperança através das Escrituras, marcando momentos sagrados de consagração e novos começos. Este ritmo reflete o desígnio de Deus, onde realidades físicas e espirituais se interligam, convidando-nos para Sua história eterna. Jesus, circuncidado e ressuscitado no “oitavo dia”, cumpre o pacto, estendendo a salvação a todos—independentemente de gênero, status ou herança. O pacto, gravado na carne, reside no coração, chamando-nos a liderar com amor, proteger com coragem e viver generosamente. Abraçando nosso lugar nesta narrativa divina, levantemo-nos, transformados, para andar em fé, personificar a esperança e refletir a promessa inabalável de um Deus que faz novas todas as coisas.
